Detectar e controlar vazamentos de fluidos refrigerantes são uma das tarefas mais difíceis enfrentadas pelos técnicos de refrigeração em seu dia a dia. Contudo, as regulamentações existentes exigem que os profissionais da área realmente encontrem e selem os pontos de escape, proibindo recargas desnecessárias para manter os sistemas em operação.
Em toda instalação frigorífica pressurizada é possível ocorrer vazamentos, principalmente nas conexões mecânicas. As fugas também ocorrem em vedações do eixo, válvulas de fechamento e do tipo globo, válvulas Schrader, condensadores e evaporadores, válvulas de alívio de pressão e outras partes.
O tamanho dos vazamentos pode variar de gramas por ano a quilogramas por segundo. Mesmo com a utilização de tecnologias de detecção mais avançadas, ou seja, de maior sensibilidade, alguns podem ser muito pequenos e de difícil localização, fato que torna as medidas de monitoramento e otimização dos sistemas de refrigeração cada vez mais relevantes.
Todos os anos, o País importa cerca de 16 mil toneladas de hidroclorofluorcarbonos (HCFCs) e aproximadamente 10 mil toneladas de hidrofluorcarbonos (HFCs). Além de serem nocivas ao clima do planeta quando liberadas na atmosfera, ambas as substâncias são caras, por causa do preço atrelado à variação do dólar.
“Atualmente, 70% desses refrigerantes importados pelo Brasil são usados em recargas em sistemas instalados”, calcula Paulo Neulaender, vice-presidente de meio ambiente da Associação Brasileira de Refrigeração, Ar Condicionado, Ventilação e Aquecimento (Abrava).
De acordo com o Ministério do Meio Ambiente (MMA), a quantidade média anual de vazamentos de fluidos frigoríficos no segmento de refrigeração comercial corresponde a 102% da carga instalada.
Mas o gasto com reposição do fluido refrigerante é apenas um dos parâmetros econômicos e ambientais a ser considerado. Em cascata, surgem outros custos, como mão de obra, perda de produtos que se deterioram nos expositores frigoríficos e aumento no consumo energético, devido à redução de eficiência dos equipamentos.
Profissionais do setor devem possuir ferramental adequado para lidar com fluidos refrigerantes, lembra Arthur Ngai, da Chemours
“Há muitas instalações antigas e, para agravar esse quadro, ainda falta conscientização do usuário quanto à necessidade de manutenção dos equipamentos e existe muita utilização de fluidos de procedência duvidosa ou desconhecida”, alerta Paulo Napoli, consultor técnico da Arkema.
A manutenção preventiva eficaz depende de diversos fatores, entre eles a contratação de empresa de manutenção habilitada à prestação de serviço de qualidade, capaz de registrar periodicamente as pressões, temperaturas, superaquecimento, sub-resfriamento, entre outros dados.
“É importante que o prestador de serviço possua o ferramental necessário para a manutenção preventiva e corretiva, como bomba de vácuo, detector de vazamento, recolhedora de fluido refrigerante, cilindros de serviço, manômetro, termômetro etc. e, principalmente, forneça informações que facilitem o diagnóstico antecipado de problemas”, salienta o gerente de negócios de produtos fluorados da Chemours, Arthur Ngai.
Mudança de paradigma
Nos últimos anos, o varejo nacional começou a dar mais atenção à questão dos vazamentos de fluidos refrigerantes, segundo Alessandro Ibiapina, diretor de sustentabilidade da Associação Paulista de Supermercados (Apas).
“Hoje, temos projetos pilotos de contenção de fugas desenvolvidos em parceria com o MMA e encontros estão sendo promovidos para a troca de experiências, envolvendo todos os grandes players do segmento”, revela.
“Por anos, a manutenção preventiva dos sistemas foi negligenciada, uma vez que não se conhecia o impacto causado. Todavia, a realidade está mudando rapidamente, não só em relação à contenção de vazamentos, mas também quanto à redução do volume de gases utilizados e à exigência para que o segmento de manutenção se capacite e acompanhe a evolução do mercado”, explica.
De acordo com Ibiapina, os supermercados participaram ativamente das discussões sobre a proposta apresentada pelo Brasil ao acordo de Kigali. Os prazos definidos nessa emenda ao Protocolo de Montreal garantem que os HFCs ainda sejam uma opção transitória à substituição dos HCFCs, caso as demais tecnologias não atinjam os ideais de viabilidade para uma mudança direta.
“Nossos esforços, agora, estão centrados na disseminação de boas práticas para a contenção de vazamentos, a fim de que as plantas atualmente instaladas com HFCs possam ser operadas durante toda sua vida útil, o que minimizará impactos ambientais”, informa.
“É necessário que a indústria de refrigeração também acompanhe as mudanças, pois não se trata de uma simples escolha de tecnologia. É necessário que haja segurança quanto à disponibilidade e custos competitivos para manutenção, peças e fluidos refrigerantes alternativos”, ressalta.
Em 2015, a Apas aderiu ao Protocolo Climático do Estado de São Paulo, durante a COP 21, em Paris. Com esse compromisso, o inventário de emissões de dióxido de carbono do setor passou a ser calculado e os primeiros resultados serão divulgados este ano.
“A participação dos fluidos refrigerantes no percentual de contribuição para as emissões de CO2 dos supermercados fica entre 22% e 26%, com casos que chegam a 40%”, informa.
Atualmente, a Apas trabalha seis grandes temas norteadores da sustentabilidade no setor supermercadista. Um deles é a eficiência energética, no qual a entidade posiciona as ações relacionadas aos fluidos frigoríficos.
Este ano, a entidade promoverá dois grandes fóruns de debate e difusão de informação a respeito do assunto: o Espaço Sustentabilidade na Apas Show, em maio, e o Encontro sobre Fluidos Refrigerantes, em outubro.
Boas práticas, sempre
Segundo Paulo Neulaender, da Abrava, algumas redes de supermercados criaram, nos últimos dois anos, equipes de caçadores de fugas em suas lojas. “Em alguns estabelecimentos, o volume de vazamentos caiu 80% após essa medida”, diz.
Para os especialistas do setor, a prioridade dos prestadores de serviços deve ser entregar ao cliente um sistema seguro e eficiente, hermeticamente selado, contendo a menor quantidade de fluido frigorífico e instalado e configurado para operar conforme as especificações e recomendações de fabricação.
“Mas muitos técnicos sequer possuem uma recolhedora de gás, sendo que seu recolhimento e reciclagem podem gerar, além de benefícios ambientais, uma economia de 30% em relação à compra de um gás novo”, exemplifica.
Contraste fluorescente facilita detecção de vazamentos de fluidos frigoríficos
Isso é particularmente relevante, pois, à medida que o cronograma nacional de eliminação de HCFCs avança, o preço desses compostos também aumenta. “No futuro, ainda devem ser lançadas outras normas para se coibir vazamentos, a exemplo da europeia F-Gas. Portanto, a reposição descontrolada de gases poluidores deixará de ser um algo comum”, avalia Kiko Egydio, diretor de operações da K11.
A importadora está trazendo ao País um inovador composto químico 100% estável que promete revolucionar a gestão de microvazamentos de refrigerantes no mercado brasileiro nos próximos anos. Trata-se do Tapa Fugas K11, produto compatível com todos os fluidos sintéticos e lubrificantes usados atualmente.
Segundo o executivo, sua fórmula é livre de polímeros e, por isso, não danifica os equipamentos. “O produto também não reage com o oxigênio e a umidade, não entope o capilar, nem a válvula de expansão, e possui homologação da Ashrae”, destaca. “Jamais um aditivo químico pode ser colocado num circuito frigorífico sem essa certificação”, reforça.
Outra inovação que a K11 está introduzindo no País este ano é um contraste fluorescente para detecção de vazamentos. Assim como o Tapa Fugas, esse é mais um produto que resulta da recém-fechada parceria entre a empresa brasileira e a norte-americana Spectronics.
“Essa é a multinacional que inventou o contraste ultravioleta (UV) em 1955 e, por isso, estamos muito felizes em poder trazer ao Brasil o que há de melhor no mundo em termos tecnologia para a detecção e eliminação de vazamentos em sistemas HVAC-R”, diz.
De acordo com Egydio, a manutenção preventiva é uma das melhores maneiras de manter um sistema frigorífico funcionando adequadamente, com a identificação e o pronto reparo de eventuais pontos de escape.
Reciclagem e regeneração
A legislação brasileira determina o recolhimento e a destinação correta de fluidos refrigerantes. Portanto, é crime liberá-los na atmosfera. Atualmente, o País possui seis centros de regeneração, localizados nas cidades de São Paulo, Osasco, Americana, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Recife.
Enquanto a reciclagem pode ser realizada in loco pelo refrigerista, por meio de uma máquina recicladora, a regeneração só pode ser feita em equipamentos mais sofisticados, com qualidade maior de filtragem e destilação do produto, a fim de permitir sua certificação em conformidade com a ARI 700, norma que especifica os níveis pureza, umidade, gases condensáveis, acidez e resíduos máximos permitidos em fluidos refrigerantes.
Segundo o gerente comercial da Arkema, Alexandre Lopes, ainda existe muito gás de baixa qualidade nos equipamentos de refrigeração instalados no País. “Isso desencoraja os fabricantes a montar um plano de recolhimento, pois essa ação poderá gerar um passivo que não nos pertence”, justifica.
“Mas esse cenário cria oportunidades para empresas locais prestarem esse tipo de serviço. Esse processo, aliás, tende a ficar cada vez mais regionalizado, devido ao custo do frete”, avalia.
“Quando os empresários se conscientizarem a respeito do meio ambiente e o preço do R-22 subir ainda mais, a demanda por fluidos recuperados aumentará, criando novas oportunidades de mercado”, prevê.
Recolher e reciclar fluidos refrigerantes resulta em economia para usuários de sistemas de refrigeração e profissionais do setor
Reportagem publicada na edição de fevereiro da Revista do Frio – Ano 26, Nº 321 – Fevereiro de 2017